Hoje, em algum pronto
atendimento do país, uma senhora de 65 anos está sendo atendida por um
neurocirurgião. Ela teve um Acidente Vascular Cerebral (AVC) hemorrágico por
ruptura de um aneurisma cerebral. Trata-se de uma doença grave, e o
neurocirurgião sabe de antemão que, apesar de todos os tratamentos instituídos
da melhor forma possível, a possibilidade dessa paciente morrer ou ficar com
sequelas é grande.
Apesar da gravidade, não
é um evento excepcional. Todo o empenho do neurocirurgião se concentra no
tratamento do aneurisma e na prevenção de complicações próprias desse tipo de
hemorragia. Exige cuidados intensivos por tempo prolongado, que pode se
estender por duas ou três semanas, se não mais.
A mesma doença em uma
celebridade não terá evolução diferente daquela do cidadão comum. Entretanto,
todos os envolvidos no tratamento se veem expostos ao furor da mídia, ávida por
notícias. Nesse turbulento ambiente, uma preocupação a mais passa a fazer parte
do trabalho médico: a preservação da privacidade do paciente e de seus
familiares.
Marisa Letícia, falecida esposa
de Lula, foi vítima de AVC e da exposição indevida de seus exames nas redes
sociais.
O tratamento do AVC não é
trabalho de uma pessoa, mas de uma equipe multidisciplinar: emergencistas,
intensivistas, neurorradiologistas, neurocirurgiões, clínicos, enfermeiras,
fisioterapeutas, psicólogos. Exige do hospital uma sofisticada infraestrutura,
além de um corpo clínico treinado no tratamento e reabilitação do
paciente. Além da capacitação técnica, todos
os envolvidos no tratamento de qualquer paciente sabem e praticam o sigilo
profissional.
Nos tempos atuais, as
pessoas estão acometidas de uma doença peculiar, a que chamei em outra crônica
de Jornalite: a imperiosa compulsão
de divulgar pelos canais sociais tudo o que parece notícia. Isso inclui fotos
de pacientes, de seus exames e de opiniões sobre todo e qualquer assunto, de
qualquer área de conhecimento.
Em um passado não muito
distante, as celebridades sofriam com a invasão e inconveniência dos paparazzi. Hoje, qualquer um de nós está
exposto ao furor das pessoas munidas de celular e de uma incontrolável
necessidade de registrar e divulgar fotos e filmes nas redes sociais.
Pelo menos no ambiente
médico essa praga deve ser combatida. Qualquer pessoa, celebridade ou não, tem
o direito à privacidade, que faz bem à saúde.
No caso de celebridades,
entretanto, é necessária a divulgação de boletins médicos, redigidos com o
cuidado de bem informar. Ávidas de informações, as pessoas devem obtê-las de
fonte segura, evitando-se assim os costumeiros boatos e deturpações das
notícias.
Outro bom serviço que a
imprensa pode prestar nessas ocasiões é o esclarecimento sobre a doença em
foco. No caso de Dona Marisa, por exemplo, foi uma boa oportunidade para educar
as pessoas sobre o AVC: seus tipos, suas causas, a importância do diagnóstico e
tratamento precoces e, sobretudo, a prevenção.
Uma boa prática seria
essa: trocar a invasão de privacidade e o sensacionalismo pela difusão de
conhecimento.
Assim, a pauta dos
jornais voltaria a ser educativa, em vez de se debruçar, como de costume, nas
atrocidades e barbaridades do mundo afora.
Revisão e formatação:
Ophicina de Arte & Prosa
Posted by
Jair Raso
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