“Solidão
apavora
Tudo
demorando em ser tão ruim
Mas
alguma coisa acontece
No
quando agora em mim
Cantando
eu mando a tristeza embora”
Caetano
Veloso, Desde que o samba é samba
Às vésperas da estreia de
minha peça, “DDD: deleite, depois delete”, resolvi fazer uma pesquisa sobre a
velhice com meus contatos no facebook . Afinal, essa comédia gira sobre três
senhoras às voltas com a internet. Pensei ser mais do que adequado usar a internet
para esse diálogo.
Lancei a seguinte pergunta: qual a doença mais grave da velhice?
Para minha surpresa, a
resposta mais frequente não foi uma doença, foi a solidão. Vinte e dois por
cento das respostas apontava a solidão como a “doença” mais grave da velhice.
Se acrescentarmos abandono, invisibilidade e outras palavras que expressam o
mesmo sentimento, o número de respostas é ainda maior.
Confesso que esperava que as
pessoas fossem se referir ao Alzheimer, ao derrame ou Parkinson, doenças comuns
no envelhecimento. Foram poucas essas respostas.
Solidão não é uma doença.
Segundo o Houaiss, solidão é um estado, uma sensação de quem se acha ou se sente
desacompanhado, só, isolado do mundo.
O poeta Caetano, em sua canção
“Desde que o samba é samba”, nos lembra que a solidão apavora, “tudo demorando
em ser tão ruim”.
Talvez seja essa a razão dessa
resposta prevalente. Não sei da idade da maioria das pessoas que respondeu à
minha pesquisa. Certamente, não são todos idosos e falam da velhice como uma
reflexão, baseados em suas experiências familiares ou em suas expectativas. Talvez
seja este o recado. A velhice, tal como a solidão, apavora.
Montaigne (1533-1592), em seus
Ensaios, trata a solidão como uma
meta para a velhice. Nos diz: “É preciso ter como reserva um recanto pessoal,
independente, em que sejamos livres em toda acepção da palavra, que seja nosso
principal retiro e onde estejamos absolutamente sozinhos. Aí nos entreteremos
de nós com nós mesmos, e a essa conversa, que não versará nenhum outro assunto,
ninguém será admitido”.
Ouvi num filme italiano que a
doença mais grave da velhice é a aposentadoria.
Penso ser a inatividade,
física ou mental.
Seja como for, a maioria de
nós quer mesmo é seguir em frente, e a estação derradeira é justamente a
velhice.
Talvez seja agora o tempo de
nos prepararmos para chegarmos a essa estação. Sozinhos.
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Crônica médica