As Olimpíadas do Rio foram um
espetáculo. O mundo todo pôde ver atletas de diversos países disputando as tão
sonhadas medalhas olímpicas. Entretanto, esse espetáculo grandioso tem uma
faceta pouco comentada: para se alcançar sucesso nesse tipo de competição, os
atletas buscam o limite do corpo humano, a superação física e metas ambiciosas
que fascinam o público. Para além do
glamour e das cifras bilionárias que acompanham os louros das vitórias, há um preço solitário a ser pago pelo atleta:
lesões agudas ou tardias em seu corpo provocadas por excesso de treinos e
competições.
Nas Olimpíadas
do Rio, um halterofilista armênio, Andranik Karapetyan, quebrou o braço ao
tentar erguer 195 kg.Na ginástica artística, o francês Samir Ait Said caiu de mau jeito durante a execução
de seu salto e fraturou a perna; a ginasta brasileira, Jade Barbosa, não teve
melhor sorte: caiu de joelhos e depois teve uma lesão no tornozelo, deixando o
estádio olímpico em cadeira de rodas; a
ciclista holandesa Annemiek van Vleuten liderava a prova de rua quando caiu,
bateu a cabeça no meio fio e sofreu traumatismo craniano. Ao invés de ir para o
pódio, acabou no CTI onde foi constatada contusão cerebral e fratura de
vértebras lombares. Também em prova de rua, o ciclista colombiano Sergio Luis
Henao fraturou a bacia, e Vicenzo Nibali
quebrou a clavícula; no futebol, na partida entre México e Fiji. O capitão do
time mexicano Oribe Peralta fraturou o nariz, e o meio de campo Rodolfo Pizarro,
a fíbula direita.
O tornozelo foi o ponto fraco de
outros competidores: após torção, o tenista alemão Dustin Brown desistiu da
partida contra o brasileiro Thomaz Bellucci. Pelo mesmo motivo, o jogador de
vôlei do Egito, Ahmed El Kotb, deixou a competição contra a Polônia na quadra
do Maracanãzinho
No judô, na luta pela repescagem da
categoria ligeiro contra a atleta da Mongólia, Urantsetseg Munkhbat, a judoca
brasileira Sarah Menezes sofreu luxação no cotovelo direito e, após a derrota,
saiu da arena com o braço imobilizado.
Marta Baeza, da esgrima, abandonou a
disputa individual de sabre contra a polonesa Bogna Jozwiak, após torcer o
joelho esquerdo.
No esporte, o tempo de recuperação do
atleta lesado nem sempre é obedecido, por razões muitas vezes obscuras.
Lesões traumáticas acidentais
realmente fazem parte do jogo, e a organização desses eventos leva em
consideração a segurança de determinados esportes. O ciclismo de rua, por
exemplo, pode ser revisto dentro dessa perspectiva. Não será a primeira vez. Nas Olimpíadas de Atenas de 1896, os
organizadores instituíram uma nova competição ciclística na qual os atletas
deveriam pedalar doze horas a fio. Sete atletas participaram, e só dois
chegaram ao final da competição. Não foi difícil decidir pela retirada dessa
modalidade como competição olímpica.
Nada,entretanto,
justifica a brutalidade de determinadas modalidades ainda consideradas
esportes. O Pancrácio, por exemplo, era um tipo de
modalidade esportiva que fez parte dos jogos olímpicos entre os anos de 648 a.
C. e 383 d. C.. Era uma forma mais violenta do que as lutas de MMA de hoje.
Misturava técnicas do boxe, da luta grega e do vale-tudo ou quase tudo e só
terminava quando um dos oponentes estava à beira da morte.
Hoje, até
autoridades como Dr. Ricardo Munir Nahas, diretor da Sociedade Brasileira de
Medicina do Exercício e do Esporte reconhece que lesões traumáticas no boxe são
corriqueiras, fazem parte do próprio esporte. Nas palavras deles, “quebrar o
nariz lutando boxe não é nada absurdo”.
Esse tipo de
conceito deve ser revisto. Há muito mais dano relacionado ao boxe do que
fraturas dos ossos da face. As lesões cerebrais causadas por traumatismos
repetidos na cabeça são irreversíveis e estão relacionados ao desenvolvimento
tardio de um tipo de demência em tudo semelhante ao Alzheimer. Esporte como
esse não deve ser considerado Olímpico. É Pancrácio disfarçado.
O espetáculo das
Olimpíadas deve ser sempre louvado como uma ode ao esporte como meio eficaz de
confraternização entre os povos.
Entretanto, é preciso levar mais a sério os limites naturais do corpo
humano e a segurança dos atletas nas competições. Caso contrário, o mote
“esporte é saúde” não passará de piada olímpica.
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Crônica médica